RECOCINE | v. 2 - n. 3 | set-dez | 2024 | ISSN: 2966-0513  
Christian Pelegrini  
Professor Adjunto da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). É Doutor em Meios e Processos  
Audiovisuais pela Universidade de São Paulo (USP), onde foi orientado por Arlindo Machado. É  
formado em Radio e TV pela UNESP de Bauru, Especialista em Teorias e Técnicas de Comunicação  
pela Fundação Cásper Líbero, Mestre em História da Ciência pela PUC de São Paulo.  
Adjunct Professor at the Federal University of Juiz de Fora (UFJF). Holds a PhD in Audiovisual Media and  
Processes from the University of São Paulo (USP), supervised by Arlindo Machado. Graduated in Radio and  
Television from UNESP in Bauru, Specialist in Communication Theories and Techniques from Fundação  
Cásper Líbero, and Master's in History of Science from PUC São Paulo.  
Mariana Lemos Schwartz  
Doutoranda em Media Artes pela Universidade da Beira Interior (Portugal) e mestra em Artes,  
Cultura e Linguagens pela Universidade Federal de Juiz de Fora (Linha de pesquisa: Cinema e  
Audiovisual - PPGACL, IAD/UFJF - Brasil).  
PhD candidate in Media Arts at the University of Beira Interior (Portugal) and Master's in Arts, Culture, and  
Languages from the Federal University of Juiz de Fora (Research Line: Cinema and Audiovisual - PPGACL,  
IAD/UFJF - Brazil).  
.
Este artigo passou por avaliação por pares cega e software anti-plágio.  
LICENÇA ATRIBUIÇÃO NÃO COMERCIAL 4.0 INTERNACIONAL CREATIVE COMMONS CC BY-NC  
FUNÇÃO POÉTICA NO DESIGN DE PRODUÇÃO  
E NA DIREÇÃO DE FOTOGRAFIA: UM ESTUDO SOBRE A PALETA  
CROMÁTICA DA PRIMEIRA TEMPORADA DE TRUE DETECTIVE  
RESUMO  
Na produção de uma obra audiovisual, diversas ferramentas são utilizadas para a criação do produto  
final. Este artigo analisa a aclamada primeira temporada da série estadunidense True Detective, exibida,  
em 2014, pelo canal HBO, com foco na paleta cromática elaborada pelo design de produção e pela  
direção de fotografia. A abordagem visa demonstrar como as imagens da série constituem um exemplo  
de função poética, conforme definida pelo linguista russo Roman Jakobson. Jakobson define a função  
poética como a ênfase na estrutura e na estética da mensagem, destacando não apenas o conteúdo, mas  
a forma como esse é apresentado. Na primeira temporada da série True Detective, essa função se  
manifesta através da meticulosa escolha das cores, texturas e composições visuais, que não só  
complementam a narrativa, mas também a enriquecem de maneira significativa. A reflexão argumenta  
que a dimensão visual da série, através de sua dessaturada paleta cromática, produz uma ambientação  
densa e rica, que amplifica e intensifica os elementos temáticos e formais da narrativa. As escolhas  
cromáticas são deliberadas para evocar emoções específicas e ressoar com os temas centrais da série,  
como a decadência moral. Além disso, a análise destaca como o design de produção e a direção de  
fotografia trabalham juntos para construir uma atmosfera que reflete e reforça os conflitos internos e  
externos dos personagens. Em suma, a análise da função poética na primeira temporada de True  
Detective revela como a série utiliza sua dimensão visual para enriquecer a narrativa, indo além do  
simples contar de uma história.  
Palavras-chave: True Detective. Design de produção. Direção de fotografia. Paleta cromática. Função  
poética.  
POETIC FUNCTION ON PRODUCTION DESIGN AND CINEMATOGRAPHY: A  
STUDY ABOUT COLOR PALETTE IN THE FIRST SEASON OF TRUE  
DETECTIVE  
ABSTRACT  
In the production of an audiovisual work, various tools are utilized to create the final product. This  
article analyzes the acclaimed first season of the American series True Detective, aired in 2014 on HBO,  
focusing on the color palette developed by the production design and cinematography. The approach  
aims to demonstrate how the series' images exemplify the poetic function, as defined by Russian linguist  
Roman Jakobson. Jakobson defines the poetic function as the emphasis on the structure and aesthetics  
of the message, highlighting not just the content but the way it is presented. In the first season of True  
Detective, this function manifests through the meticulous choice of colors, textures, and visual  
compositions, which not only complement the narrative but also significantly enrich it. The reflection  
argues that the series' visual dimension, through its desaturated color palette, produces a dense and rich  
ambiance that amplifies and intensifies the thematic and formal elements of the narrative. The deliberate  
color choices evoke specific emotions and resonate with the series' central themes, such as moral decay.  
Moreover, the analysis highlights how production design and cinematography work together to build an  
atmosphere that reflects and reinforces the internal and external conflicts of the characters. In sum, the  
analysis of the poetic function in the first season of True Detective reveals how the series uses its visual  
dimension to enrich the narrative, going beyond mere storytelling.  
Keywords: True Detective. Production design. Cinematography. Color palette. Poetic function.  
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INTRODUÇÃO  
Os méritos de uma narrativa audiovisual podem vir de cada uma das inúmeras formas  
expressivas que a compõem, ou de várias delas simultaneamente. Uma crítica objetiva e  
criteriosa exige essa etapa preliminar de escrutínio acerca dos muitos processos estéticos que  
transcorrem ante os olhos do espectador e colaboram com o sentido global do texto. Uma vez  
identificados os processos estéticos superpostos, cabe deslindar os mecanismos de ação das  
linguagens empregadas e apontar como as escolhas geram determinados efeitos.  
Ao abordarmos a primeira temporada da série estadunidense True Detective (HBO,  
2014), nosso objetivo é justamente depurar aspectos de seu design de produção e direção de  
fotografia e explicitar os mecanismos pelos quais tais formas expressivas colaboram com a  
construção de um sentido global. Para além de uma análise dos sentidos denotados pelas  
imagens, nossa investigação se volta para a construção de uma função poética, no sentido  
jakobsoniano, que satura o texto de uma atmosfera sinestésica impregnante. Tal atmosfera serve  
de interstício aos sentidos denotados, acentuando os saberes da narrativa, mas especialmente  
conduzindo o “sentir” daquilo que é visto.  
Nestes termos, a proposta articula o conceito de função poética, oriundo do campo da  
linguística e do método estruturalista, com uma materialidade audiovisual e em certas  
expressões que compõem o audiovisual. É certo que tais aproximações nem sempre ocorrem de  
forma pacífica, seja pela diferença intrínseca entre essas materialidades (Andrew, 2002), seja  
pela detração aguerrida de pesquisadores do audiovisual (Stam, 2000). No entanto, nossa  
abordagem não pretende homologar o verbal e o audiovisual em sua totalidade. A intenção é  
mais restrita, circunscrevendo nossa comparação ao funcionamento de certos mecanismos  
expressivos. Tal como Bordwell (2008, p. 12) emprega, a poética:  
de qualquer mídia estuda a obra acabada como o resultado de um processo de  
construção um processo que inclui componentes de artifício (e.g. regras  
práticas), os princípios mais gerais de acordo com os quais a obra é composta,  
e suas funções, efeitos e usos. Qualquer investigação sobre os princípios  
fundamentais pelos quais uma obra de qualquer mídia é construída pode cair  
no domínio da poética.  
Nosso objetivo é, destarte, desenvolver uma investigação sobre essa poética na primeira  
temporada da série True Detective. No entanto, diante do isomorfismo da palavra (“poética”  
com as duas acepções diferentes), o utilizaremos apenas na qualificação do fenômeno analisado  
por Roman Jakobson: a função poética.  
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O trabalho se divide em duas partes. A primeira se volta para o conceito de função  
poética conforme consta na obra do linguista russo Roman Jakobson. Nossa abordagem da  
função poética instrumentaliza o processo de análise da série ao indicar os mecanismos  
mobilizados em comunicações que transcendem a denotação para construir sentidos outros  
engendrados nos processos de seleção e combinação. Por fim, nós voltamos à construção visual  
de True Detective, dando ênfase à paleta cromática da série.  
Antes de prosseguir, cabe aqui um alerta sobre a perspectiva da condução desta reflexão.  
A análise de um processo estético em um filme ou em qualquer outra expressão artística suscita  
conjecturas um tanto perigosas, na forma de inferências sobre as motivações e as decisões  
criativas. Um alerta mais que eloquente é feito pelo veterano cineasta Sidney Lumet, em seu  
livro Fazendo Filmes:  
Certa vez perguntei a Akira Kurosawa por que decidira fazer uma tomada de  
Ran de determinada maneira. A resposta foi que se tivesse colocado a câmera  
uma polegada para a esquerda, a fábrica da Sony apareceria na tomada, e se  
colocasse a câmera uma polegada para a direita veríamos o aeroporto –  
nenhuma das duas paisagens cabia num filme de época. Somente a pessoa que  
fez o filme sabe o que pesa nas decisões que resultam em qualquer obra  
concluída. Pode ser qualquer coisa, de exigências do orçamento a inspiração  
divina (Lumet, 1998, p. 9).  
Assim, embora nossa análise se valha, sempre que possível, de documentos sobre o  
processo das escolhas criativas, na forma de entrevistas e declarações dos realizadores  
responsáveis pelas decisões, nossa proposta não é a de compreender os planos e motivações  
que levaram ao aspecto fixado na tela; ela parte da tela e das sensações que esta suscita no  
espectador.  
FUNÇÃO POÉTICA  
A sistematização do conceito de função poética parte de uma reflexão em que Jakobson  
também aborda outras “funções” da linguagem (1991, p. 123). Entretando, nosso uso do termo  
prescinde que recuperemos os demais. Basta observar que o fenômeno consiste em uma  
composição que não se limita a uma representação objetiva de algo. Aliás, longe de funcionar  
como uma ferramenta para representação do mundo (certamente a função referencial da  
linguagem é mais adequada), a função poética atua provocando efeitos nem sempre objetivos e  
determinados; a depender do conteúdo da mensagem, a função poética pode recobri-la de  
efeitos sinestésicos, mnemônicos ou afetivos.  
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Na função poética, os mecanismos de linguagem, apropriados por Jakobson do suíço  
Ferdinand Saussure (Jakobson, 1991), interagem de modo bastante específico nos ditos eixos  
de linguagem. Trata-se das relações existentes entre os signos conforme duas lógicas, em  
princípio, distintas. O eixo paradigmático é essa categoria virtual que uma palavra qualquer  
participa com outras, in absentia, segundo um determinado critério. No uso cotidiano da  
linguagem verbal, talvez os paradigmas mais usuais sejam aqueles ordenados de acordo com o  
significado. Impossível não recorrer ao exemplo mais que didático de Jakobson (1991, p. 128):  
ao afirmar que em “O menino dorme”, poderíamos ter preterido a palavra “menino” por “guri”,  
“garoto”, “moleque” etc. Idem para recusar “dorme” em favor de “cochila”, “cabeceia”,  
“dormita” etc. Embora o critério mais recorrente no uso cotidiano da linguagem verbal seja sua  
dimensão semântica, também podem ser mobilizados paradigmas cujo critério não seja o  
significado, mas a sonoridade da palavra: “bola” participa de um paradigma com “cola”, “rola”;  
ou “belo”, “bolo” etc.  
Enquanto os paradigmas são os estoques onde um falante da língua vai selecionar cada  
um dos elementos para compor a mensagem, é essa justaposição que concretiza a mensagem  
como um sintagma. O eixo das relações sintagmáticas atualiza a virtualidade dos paradigmas  
ao obrigar cada signo selecionado a relações in presentia com os demais. O sintagma é a  
configuração singular assumida pelas muitas possibilidades permitidas pelos paradigmas.  
Para Jakobson, algo peculiar ocorre quando um falante extrai mais de um signo de um  
mesmo paradigma e, com eles, compõe um sintagma: ocorre, aí, a função poética. “A função  
poética projeta o princípio de equivalência do eixo de seleção sobre o eixo de combinação. A  
equivalência é promovida à condição de recurso constitutivo da sequência” (Jakobson, 1991, p.  
130). O famoso exemplo derivado da campanha eleitoral americana, “I like Ike” (Jakobson,  
1991, p. 128) explicita que, para além da mera referência ao candidato Eisenhower (“Ike”), há  
a construção de uma sonoridade peculiar, mescla de assonância e aliteração, que dota a frase de  
uma qualidade quase musical. E, neste exemplo como em outros, tal qualidade ocorre porque a  
manifestação de apreço pelo candidato escolheu signos para este sintagma que também  
guardam, entre si, uma relação paradigmática (a semelhança sonora). Quando isso ocorre, é o  
critério de organização paradigmática que emerge na superfície do que é dito. Outro exemplo  
trazido por Jakobson (1991, p. 128) Uma moça costumava falar do “horrendo Henrique”. "Por  
que horrendo?” “Porque eu o detesto.” “Mas por que não terrível, medonho, assustador,  
repelente?” “Não sei por que, mas horrendo lhe vai melhor.” Sem se dar conta, ela se aferrava  
ao recurso poético da paronomásia”  
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O fato de ocuparem um mesmo paradigma (ordenado segundo sua sonoridade), torna o  
sintagma “carregado” desta mesma sonoridade. Cabe apontar também o equívoco de uma  
equivalência absoluta entre função poética e poesia: “Qualquer tentativa de reduzir a esfera da  
função poética à poesia ou de confinar a poesia à função poética seria uma simplificação  
excessiva e enganadora” (Jakobson, 1991, p. 128). Se uma boa poesia pode transcender os  
mecanismos da função poética, também cabe alertar que nem toda função poética é,  
necessariamente, sofisticada. Construções de função poética previsíveis e formulaicas são  
processos estéticos bastante simplórios, de uma poética degenerada e indiferente (mas,  
conceitualmente, ainda uma função poética).  
Embora o objeto imediato das reflexões de Jakobson fosse a linguagem verbal, fazemos  
eco à tradição estruturalista de assumir o verbal como um modelo para se compreender outras  
tantas linguagens (Barthes, 1996, p. 11). Assim, ao retornarmos às formas expressivas da  
linguagem audiovisual, continuam válidos os eixos de linguagem e os efeitos da sobreposição  
do paradigma sobre o sintagma.  
Uma análise de um figurino, por exemplo, pode encontrar na combinação de peças de  
vestuário selecionadas para um determinado personagem algo além de suas meras funções de  
vestir; se as peças que cobrem cada parte do corpo também mantiverem entre si qualquer  
relação, é o critério desta relação que será emanado pelo figurino. A escolha de tecidos  
sintéticos ou de peças com corte muito justo vão suscitar, em relação ao personagem, sua  
inorganicidade ou uma tensão física que reforçam a própria semântica do personagem. É  
evidente que tais relações dependem de uma leitura fundamentada em um “léxico” determinado  
pela cultura e pelo repertório sobre vestuário que o espectador domine. E isso reitera às  
variações do grau de complexidade e sofisticação que o processo exibe no nível da imanência.  
O exemplo do figurino pode ser estendido às demais formas expressivas do audiovisual.  
Escolhas de cinematografia, montagem, aspectos dramatúrgicos, sonoplásticos e tantos outros  
podem ser mobilizados a cumprirem suas funções de modo referencial, atendendo às demandas  
da narrativa e apresentando uma história. Mas também podem, no processo de seleção e  
combinação das formas expressivas, projetar eixos paradigmáticos sobre os eixos  
sintagmáticos. Em tais situações, a função poética colabora com sentidos outros para a narrativa  
denotada pelas imagens e sons.  
Os efeitos da função poética na direção de fotografia e no design de produção podem  
ocorrer na manipulação de inúmeras escolhas feitas no âmbito dessas especialidades. Um breve  
passeio pelas imagens da trilogia das cores, de Krzysztof Kieslowski (1993-1994), revela que  
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muitos objetos de cena, enquadramentos e composições visuais são escolhidos e combinados  
para remeter às cores de cada filme: azul, branco e vermelho, em alusão à bandeira francesa.  
Trata-se de um processo que o filme publicitário já conhece e exercita na maioria de  
suas obras. Ainda que o processo retórico de um filme publicitário e os efeitos pretendidos  
sejam bastante distintos, os mecanismos da função poética atuam de forma muito parecida. Um  
filme do Banco do Brasil possui objetos de cena e escolhas fotográficas que reiteram nas  
imagens as cores amarelo e azul anil; em um filme do Banco Itaú, objetos e fotografia reforçam  
o laranja e o azul escuro. Cada empresa é representada, na tela, por seu nome (áudio e imagem)  
e por sua logo; mas sua presença é mais pervasiva, saturada nas cores em uma espécie de  
aliteração cromática.  
A análise da primeira temporada de True Detective observará fenômenos dessa mesma  
natureza, dando ênfase às escolhas feitas pelos profissionais na seleção e combinação de cores.  
Acreditamos que nas decisões do design de produção e da direção de fotografia, a função  
poética se manifesta imprimindo na tela sentidos muito além dos denotados pelas imagens  
registradas.  
Em outras palavras:  
a linguagem do cinema tem o poder de criar narrativas diversificadas, podendo  
ser construídas pelo autor da obra sem uma gramática visual, já que a  
linguagem visual é criada mediante a aplicação dos meios técnicos e criadores  
de cada cineasta. Assim, a imagem, apesar da sua exatidão figurativa, é  
extremamente maleável e ambígua ao nível de sua interpretação, devendo ser  
trabalhada de acordo com os significados que se deseja transmitir (Martin,  
2003, p. 18).  
Dentre todos os elementos da linguagem visual, a cor atrai bastante atenção justamente  
em função de seu poder expressivo. Embora a teorização sobre a cor já seja bastante sólida  
desde, pelo menos, o Renascimento, o histórico da exploração da cor no cinema é simultâneo  
ao próprio advento do meio (Machado, 2001. p. 201). Também é fato que a exploração da cor  
enquanto o cinema se apoiava em tecnologias fotográficas analógicas deixou para a posteridade  
exemplos de virtuosismo e apuro estético inebriantes (e.g. nos musicais de Hollywood).  
Todavia, a mudança da matriz tecnológica para o digital concedeu aos realizadores um grau de  
controle e apuro técnico que alteraram o patamar do que podia ser feito após as filmagens. É  
deste grau de preciosismo que tratamos aqui.  
Muitas são as obras nas quais o trabalho com as cores salta aos olhos até mesmo do  
espectador leigo. Isso acontece, normalmente, com cores vibrantes, muito saturadas e que  
tendem a chamar a atenção das pessoas, como o vermelho no filme O fabuloso destino de  
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Amélie Poulain (Jean-Pierre Jeunet, 2001) ou o excesso multicolorido da série de TV Pushing  
Daisies (ABC, 2007-2009). Nosso objeto de análise, no entanto, vai no sentido contrário,  
optando por uma composição cromática bastante dessaturada e que, justamente por isso,  
poderia passar de maneira despercebida. Entretanto, nossa argumentação é que ainda assim  
essas escolhas imprimem uma qualidade sensorial às imagens denotativas na primeira  
temporada da série True Detective.  
DO ROTEIRO ÀS IMAGENS  
Joly afirma que:  
para compreender melhor as imagens, tanto a sua especificidade quanto as  
mensagens que veiculam, é necessário um esforço mínimo de análise. Porém,  
não é possível analisar essas imagens se não souber do que se está falando  
nem porque se quer fazê-lo (Joly, 1999, p. 28).  
Ao analisarmos os episódios e algumas questões referentes ao gênero neo noir1, emergiu  
a hipótese sobre as regularidades em certas questões de estilo serem o resultado de uma função  
poética para intensificar alguns efeitos da história.  
Para Joly (1999, p. 73), “uma imagem, assim como o mundo, é indefinidamente  
descritível: das formas às cores, passando pela textura, pelo traço, pelas gradações, pela matéria  
pictórica ou fotográfica, até as moléculas ou átomos”. A leitura de uma imagem pode ser algo  
complexo, na qual muitos fatores atuam em conjunto e cada um possui o seu papel que irá afetar  
a compreensão do observador. Segundo Joly, trata-se de uma difícil tarefa encontrar o  
“equivalente visual” de um projeto verbal, visto que um mesmo roteiro (verbal) pode se  
materializar em diversos tipos de representações visuais vinculadas à riqueza infinita da  
experiência de cada indivíduo.  
Joly atenta, ainda, para algo que já alertamos: o fato de que não devemos nos proibir de  
interpretar uma obra sob o pretexto de não se ter certeza de que aquilo que compreendemos  
corresponde às intenções do autor, visto que ninguém sabe exatamente o que o autor pretendeu  
dizer e o próprio autor não domina toda a significação da imagem que produz. De acordo com  
a autora, interpretar uma mensagem:  
não consiste certamente em tentar encontrar ao máximo uma mensagem  
preexistente, mas em compreender o que essa mensagem, nessas  
circunstâncias, provoca de significações aqui e agora, ao mesmo tempo que se  
tenta separar o que é pessoal do que é coletivo” (Joly, 1999, p. 44).  
1 A análise das imagens da primeira temporada de True Detective foi um empreendimento que teve início em uma pesquisa de Trabalho de  
Conclusão de Curso e, posteriormente, foi desenvolvida em uma pesquisa de Mestrado (ver Autor 2, 2019).  
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Ao aceitarmos a tarefa de analisar imagens em movimento, percebemos que,  
diferentemente da leitura de um texto, no qual passamos nossos olhos por todas as palavras e  
interpretamos a mensagem ali escrita, ao assistirmos a uma obra audiovisual, nem sempre  
notamos de forma consciente tudo que está sendo apresentado naquela imagem. Não só os  
planos costumam possuir uma curta duração, como também nossos olhos, que apesar de  
poderem “viajar” pelo quadro, costumam focar na ação dos personagens, frequentemente  
abstraindo o que está os rodeando. Bordwell explica que, às vezes,  
os olhos seguem objetos que se movem lentamente por meio de movimentos  
suaves de busca; porém, na maior parte do tempo, nossos olhos pulam de um  
lugar a outro, três ou quatro vezes por segundo, por meio de pequenos saltos  
que chamamos de movimentos sacádicos. Esses movimentos exploram o meio  
ambiente, focalizando com precisão apenas alguns fragmentos e por somente  
um quarto de segundo. Se o assunto valer a pena investigar, micromovimentos  
sacádicos movem a fóvea ligeiramente para o alvo. O processo de busca visual  
é ativo, rápido e decorre de nossa herança biológica. Sondar o ambiente e nele  
detectar mudanças fixando os aspectos essenciais constituiu uma evolução  
muito vantajosa para os mamíferos como nós (Bordwell, 2008, p. 67).  
O diretor de fotografia Vilmos Zsigmond, (apud Bordwell, 2008, p. 68), comenta que  
“quando uma tomada vai ficar na tela só por três segundos não há tempo para decidir o que é  
importante, então, você tem de dirigir o olhar, forçar mesmo”.  
As técnicas de iluminação, composição e interpretação reforçam nossa deriva  
natural em direção a corpos, olhares e expressões faciais. E o diretor que  
coloca muita coisa competindo pela nossa atenção, provavelmente, nos guiará  
cuidadosamente para os lugares mais importantes. Muitas táticas de  
encenação, portanto, podem ser encaradas como maneiras de administrar a  
busca visual do espectador - não necessariamente “forçá-lo”, no sentido forte  
de Zsigmond, mas guiá-lo ou proporcionar uma linha de menor resistência,  
que, pelas pressões inerentes à situação da sala de cinema, arrastará a maioria  
dos espectadores [...]. Com muito mais frequência do que admitimos, as  
escolhas estilísticas atendem à denotação narrativa, principalmente por sugerir  
onde olhar e onde não olhar- sempre tendo em mente que o interesse do  
espectador está também sujeito à magia gravitacional dos corpos desenhados  
com a luz da tela (Bordwell, 2008, p. 69).  
As falas de Zsigmond e Bordwell corroboram a nossa crença de que no ato de assistir a  
um filme ou a uma série não apreendemos a totalidade das cenas, porque todo plano contém  
uma pluralidade de enunciados narrativos que se superpõem. Contudo, o fato de não repararmos  
em tudo que está na imagem não diminui a importância de cada elemento, visto que, mesmo  
sem notarmos de forma consciente, impressões são capturadas e afetam sobremaneira a nossa  
percepção do filme ou da série.  
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Retornando a Joly (1999, p. 42), “reconhecer motivos nas mensagens visuais e  
interpretá-los são duas operações mentais complementares, mesmo que tenhamos a impressão  
de que são simultâneas”. Ao analisarmos uma imagem, devemos decifrar as significações  
implicadas na aparente naturalidade das configurações visuais. A autora elucida que, “para  
compreender melhor o que a mensagem me apresenta concretamente, devo me esforçar para  
imaginar que outra coisa poderia ver nela” (Joly, p. 53). Dessa forma, não apenas a presença,  
como também a ausência de um elemento é resultado de uma escolha que deve ser ponderada  
pela análise.  
Ao considerarmos uma imagem como um sintagma visual composto de diversos tipos  
de signos, estamos considerando-a como uma forma expressiva, às vezes mais, às vezes menos  
codificada. Os elementos plásticos das imagens - cores, formas, composição, textura podem  
ser signos plenos e inteiros e não simples material de expressão dos signos icônicos  
(figurativos). Para Joly (1999, p. 93), “uma parte da significação da mensagem visual é  
determinada pelas escolhas plásticas e não unicamente pelos signos icônicos analógicos,  
embora o funcionamento dos dois tipos de signo seja circular e complementar”.  
Até certo ponto, a significação de uma mensagem visual é construída pela interação de  
diferentes ferramentas, de distintos tipos de signos. A interpretação destes signos joga com o  
saber cultural e sociocultural do espectador, de cuja mente é solicitado um trabalho de  
associações. Independentemente da sua natureza expressiva ou comunicativa, uma imagem  
sempre constitui uma mensagem para alguém.  
Dentre as diversas ferramentas presentes nas imagens de obras audiovisuais, as cores  
podem passar, muitas vezes, despercebidas pelo público leigo, não obstante, a presença de  
determinada cor nos proporciona sensações e acentua clima e situações, nos auxiliando a  
adentrar a trama e compreender a personalidade dos personagens nela retratados. As cores  
funcionam, portanto, como signos, participando da significação da mensagem visual.  
Modesto Farina, Clotilde Perez e Dorinho Bastos (2006) afirmam que as cores intervêm  
em nossa vida, influenciando o ser humano, tanto fisiologicamente como psicologicamente.  
Devido ao fato de cada cor possuir uma vibração determinada em nossos sentidos e de cada um  
poder atuar como estimulante ou perturbadora na consciência e em nossos impulsos e desejos,  
elas são capazes de produzir impressões, sensações e reflexos sensoriais de grande importância.  
Sobre o indivíduo que recebe a comunicação visual, a cor exerce uma ação  
tríplice: a de impressionar, a de expressar e a de construir. A cor é vista:  
impressiona a retina. E sentida: provoca uma emoção. E é construtiva, pois,  
tendo um significado próprio, tem valor de símbolo e capacidade, portanto, de  
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construir uma linguagem própria que comunique uma ideia (Farina; Perez;  
Bastos, 2006, p. 13).  
Ainda de acordo com Farina, Perez e Bastos (2006), as cores assumem polarizações de  
sentido, ou seja, em determinado contexto, podem carregar sensações positivas e, em outro,  
podem assumir sensações absolutamente negativas. Embora a reação de um indivíduo à cor ser  
particular, subjetiva e relacionada a vários fatores, os psicólogos estão de comum acordo  
quando atribuem certos significados a determinadas cores que são básicas para qualquer pessoa  
que viva dentro da nossa cultura.  
Na produção de uma obra audiovisual, apesar de não existirem regras para o uso das  
cores, entender os seus efeitos cognitivos auxilia a construção de uma história. A respeito das  
associações materiais e afetivas que as cores são capazes de desencadear, Tami Abreu e Ana  
Lúcia Andrade (2016, p. 4) discorrem que:  
essas ligações são culturais, relacionando-se tanto com o contexto histórico  
geral, quanto com a história particular do indivíduo. Portanto, as cores, além  
de possuírem significados universais que podem ser alterados por meio da  
relação da coexistência com outras cores e com os demais elementos  
cinematográficos , assumem sentidos pessoais que variam de acordo com as  
lembranças, as circunstâncias de vida, as experiências cotidianas, a educação  
e a construção psíquica de cada sujeito.  
Conforme Marcel Martin (2003), com o passar do tempo, os diretores compreenderam  
que as cores nos filmes não precisavam ser realistas e que deveriam ser utilizadas  
principalmente em função dos valores e das implicações psicológicas e dramáticas das diversas  
tonalidades. Portanto, atualmente, as cores são percebidas como um elemento significativo da  
linguagem cinematográfica e até mesmo a “ausência da cor” pode ser uma ferramenta poderosa  
na construção da narrativa.  
Na maioria das vezes, ao assistir a um filme, o espectador não percebe, mas está sendo  
afetado pelas cores. Bevil Conway, neurocientista especializado em visão e cor, discorre a  
respeito das emoções transmitidas pelas cores e sobre o porquê de nós, como espectadores,  
entendermos o que elas estão tentando comunicar. Para o cientista, faz sentido que os filmes se  
comuniquem através de matizes, porque as cores são uma importante fonte de informação para  
os humanos. De acordo com Conway, nós somos biologicamente preparados para nos importar  
com as cores, porque são ferramentas úteis para nos informar sobre a condição social das  
pessoas e do nosso ambiente, trata-se de maneiras importantes de nos dizer quão brava, doente  
ou saudável uma pessoa está. No entanto, segundo o cientista, a biologia não é a única resposta.  
Ele acredita que, provavelmente, as associações cor-conceito podem ter a ver também com as  
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escolhas aleatórias feitas por cineastas no passado, que eventualmente se tornaram convenções.  
Então, de alguma forma, nossa resposta às cores é uma interação de ambos (Sneed, 2015).  
A cor é uma parte crucial do storytelling do cinema e, apesar do poder das ferramentas  
modernas de correção de cor, o “tom” de um filme não é apenas responsabilidade da pós-  
produção. O diretor trabalha juntamente com o diretor de fotografia, com o designer de  
produção e com o figurinista para criar uma paleta de cor que combine com a história. A paleta  
cromática é amplamente influenciada pela temática, pelo ambiente e pela época em que se passa  
a trama, entre muitos outros fatores.  
A respeito das cores em uma produção cinematográfica, Tom Frazer e Adam Banks  
(2013, p. 96) ressaltam que:  
o diretor (e algumas vezes o escritor) normalmente decidirá e controlará o que  
é expressado pela cor, embora os efeitos tenham de ser percebidos pelos  
diretores de arte e de fotografia. Que cores serão identificadas com  
personagens, como o verde de Madeleine em Um corpo que cai (1958)? Que  
cor será enfatizada em paisagens, fundos e interiores? E aqueles pequenos  
detalhes? Mesmo a cor de um saleiro pode estar impregnada de significado.  
Nada em um filme está lá por acaso [...].  
Segundo Patti Bellantoni (2005), as cores possuem sua própria linguagem, o que pode  
ajudar visualmente a definir o arco de um personagem ou as camadas de uma trama. A autora  
afirma que costuma atribuir características para uma cor, pois, após anos de investigação,  
concluiu que as cores possuem sim personalidades distintas. Ela cita como exemplo o vermelho  
vibrante, que é uma cor sensual. Isso não significa que a cor em si possui essa propriedade  
emocional inerente, significa que pode provocar essa resposta física e emocional no espectador.  
As cores proporcionam, para os responsáveis por uma produção audiovisual, diversas  
possibilidades, uma vez que, dependendo de suas combinações e das articulações com outras  
dimensões da expressão cinematográfica, podem expressar sentidos e significados. Apesar do  
seu papel nem sempre ostensivo, as paletas cromáticas são fulcrais não apenas para a criação  
de atmosferas, como também para despertar sensações e sentimentos nos espectadores, realçar  
determinados aspectos dos personagens, exercer o papel de metáforas, entre outras funções.  
CORES EM TRUE DETECTIVE  
A série True Detective é constituída por quatro temporadas lançadas em 2014, 2015,  
2019 e 2024. Trata-se de uma antologia de temporadas, ou seja, cada temporada conta uma  
história completa, sem qualquer relação entre elas que não seja a temática criminal. Escrita por  
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Cary Joji Fukunaga e dirigida por Nic Pizzolatto, a primeira temporada foi a que obteve maior  
sucesso entre o público e a crítica, sendo considerada uma obra-prima do canal HBO.  
A primeira temporada de True Detective subverte o cenário típico das obras noir ao  
substituir a sombria metrópole por uma cidade quente e úmida do interior dos Estados Unidos.  
A história, que apresenta três períodos diferentes de maneira não linear, 1995, 2002 e 2012, se  
passa no estado de Louisiana e acompanha os detetives Martin Hart (Matthew McConaughey)  
e Rustin Cohle (Woody Harrelson). Em 1995, os protagonistas, que possuem personalidades  
muito distintas, são designados a resolver um homicídio macabro e, ao longo de oito episódios,  
desdobramentos dessa investigação são apresentados.  
Rustin, recém-chegado à delegacia, é um detetive solitário e introspectivo. Divorciado,  
sofre devido a traumas do passado e é descrente na humanidade, ademais, procura focar no  
trabalho e é um ótimo investigador. Diferentemente desse, Martin é um típico pai de família  
com atitudes reprováveis. Na maior parte da trama, Martin mora com a sua esposa Maggie  
(Michelle Monaghan) e suas duas filhas.  
Conforme Mat Patches (2014), Nic Pizzolatto almejava que não só a trama da série  
surpreendesse o espectador, mas que as imagens também fossem dignas de admiração. Para  
tanto, reuniu Cary Fukunaga, diretor dos longas-metragens Sem Identidade (2009) e Jane  
Eyre (2011), Adam Arkapaw, diretor de fotografia dos aclamados Reino Animal (2010) e Os  
Crimes de Snowtown (2011) e Alex DiGerlando, designer de produção do premiado Indomável  
Sonhadora (2012).  
Ao observarmos as imagens da primeira temporada de True Detective, um dos primeiros  
aspectos que notamos é a sua paleta de cor característica, que se sobressai diante de muitos  
outros programas televisivos e até mesmo das outras temporadas da série em questão. A obra  
apresenta uma paleta cromática pouco saturada, com quase nenhuma cor vibrante e pouco  
contraste entre elas.  
A cor predominante nesta temporada é o marrom que, segundo Eva Heller (2012),  
apesar de estar por toda a parte, é a cor mais frequentemente rejeitada pelas pessoas. O marrom,  
ainda que seja associado ao aconchego, é associado também ao feio, à preguiça, ao intragável,  
ao apodrecimento. Heller comenta que, na Idade Média, uma vez que a vestimenta marrom não  
possuía tingimento, essa era a cor das roupas dos pobres e, talvez por isso, fosse considerada a  
cor mais feia.  
Devido ao fato de a história de True Detective se passar em uma região pouco  
desenvolvida, a utilização do marrom não é algo surpreendente. No entanto, nos chama atenção  
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o fato de ele ser utilizado com tanta abundância, não somente nos objetos e ambientes, mas  
também na pós-produção, já que as cores em geral não são saturadas e a imagem em si possui  
um aspecto pálido, “sem vida”, como se estivesse constantemente empoeirada. Segundo Steven  
Bodner (s.d.), colorista da obra em questão, o diretor, Cary Joji Fukunaga, e o diretor de  
fotografia, Adam Arkapaw, queriam que “tudo fosse muito real e orgânico”.  
Ao descrever a região, o personagem Rustin diz, no primeiro episódio: “este lugar é  
como a memória de alguém de uma cidade, e a memória está desaparecendo. É como se nunca  
tivesse existido nada aqui além da selva2 (29’09”). O aspecto das imagens e a cor marrom  
contribuem para a criação da atmosfera de um local pouco vibrante, que está a desvanecer-se.  
O marrom está presente na maioria das cenas. Nos ambientes é encontrado nos  
elementos de madeira e nos objetos de cena, além de estar presente nos figurinos dos  
personagens. Tanto Rustin Cohle como Martin Hart utilizam frequentemente roupas em tons  
de marrom, portanto não se sobressaem nos ambientes, tornando-se mais um elemento na  
textura geral. Adam Arkapaw, entrevistado por Patches (2014), comenta que em algumas cenas,  
para realçar a casa de Rustin, lançou mão de um filtro de vidro marrom em sua lente, ao invés  
de deixar para a pós-produção executar este efeito. Este fato reitera o desejo da equipe em  
ressaltar o marrom na estética das imagens (Figura 1).  
Figura 1 Fotogramas da série True Detective: salas de jantar da família Hart e do detetive Rustin  
com suas respectivas paletas cromáticas  
Fonte: True Detective (HBO, 2014)  
É interessante perceber como o nome, Rustin Cohle, apelidado pelos demais  
personagens como Rust Cohle, faz alusão à ferrugem (rust), ao passo que Cohle soa como coal,  
ou seja, carvão. O nome do personagem reflete o ambiente onde se desenvolve a história e sua  
2 Tradução nossa. No original: “This place is like somebody’s memory of a town, and the memory is fading. It’s like there was never anything  
here but jungle”.  
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própria personalidade, ambos foram deteriorados, corrompidos, com os passar do tempo em  
virtude de agentes externos. Além disso, as palavras nos remetem também às cores marrom e  
cinza.  
Trata-se de uma história que, além de se passar no interior dos EUA, é sombria e possui  
poucas cenas felizes. A cor marrom, portanto, auxilia a salientar essas questões. Além disso,  
boa parte da trama se passa nos anos 1990, e as imagens dessaturadas colaboram para retratar  
esse flashback.  
Ao observarmos as paletas de cores das cenas, percebemos que o cinza é outra cor  
presente em abundância, não apenas nos cenários, como também nos figurinos. De acordo com  
Heller, essa cor é relacionada a todos os sentimentos sombrios, como a solidão, o vazio, o hostil  
e o insensível. Assim como o marrom, pode ser associada à decomposição e, consequentemente,  
ao intragável. A autora comenta que o cinza é uma cor sem força e sem caráter.  
O cinza está associado tanto ao preto, como ao branco, uma vez que é formado a partir  
da mistura dessas cores. A história em questão apresenta, constantemente, as dualidades  
sombra/luz, bem/mal, normal/sobrenatural e reitera, principalmente por meio dos diálogos de  
Rustin e das atitudes dos demais personagens, que o ser humano é um conjunto desses extremos.  
Ademais, o cinza está presente nas fumaças e nas indústrias da região, ou seja, nessa poluição  
ambiental e visual que corrói o que resta de vida no local. Como no caso do marrom, a presença  
do cinza não é algo que provoca espanto e está de acordo com os sentimentos que a história  
provoca no espectador, auxiliando a realçar esses sentimentos e a facilitar a imersão do  
espectador na trama narrada (Figura 2).  
Figura 2 Fotogramas da série True Detective: detetives na margem de um rio e Rustin na delegacia  
com suas respectivas paletas cromáticas  
Fonte: True Detective (HBO, 2014)  
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Além do marrom e do cinza, podemos ressaltar também o verde que aparece em grande  
quantidade devido à natureza da região. O verde é, conforme Heller (2012), a cor que possui  
mais variações, pois ele se modifica mais que as outras cores com a luz e, em virtude de ser a  
mais neutra das cores em nossa simbologia, dependendo das combinações, pode ter um efeito  
negativo ou positivo. É a cor simbólica da natureza e em True Detective o verde se encontra,  
principalmente, no exterior dos cenários (Figura 3).  
Figura 3 Fotogramas da série True Detective: casa do antagonista Errol Childress e casa de Rustin  
em 2012 com suas respectivas paletas cromáticas  
Fonte: True Detective (HBO, 2014)  
Um dos cenários mais icônicos da série é a casa do personagem Errol Childress. O  
exterior da residência é composto por uma densa vegetação que comprime a casa. Internamente,  
o ambiente é repugnante e o verde do exterior se faz presente nas janelas. Trata-se de uma casa  
que, por fora, parece inabitada e se camufla em meio à natureza.  
O designer Alex DiGerlando (apud Autor 2, 2019) comenta que a concepção da paleta  
de cor da obra ocorreu de forma natural. A partir do momento em que utilizaram o ambiente  
como fonte de inspiração e que buscaram retratá-lo de uma maneira mais “documental”, essas  
cores naturalmente acabaram predominando. Ele não queria ressaltar nenhum elemento da arte,  
almejava que os cenários parecessem fazer parte desses ambientes há muito tempo. Segundo  
DiGerlando, naquela região, devido à umidade, há uma espécie de “pátina enferrujada” nos  
elementos, além de muita vegetação, portanto, há uma abundância da cor verde.  
São os relatos de DiGerlando e Arkapaw que nos devolvem à discussão sobre a função  
poética. Cabe observar que a narrativa de True Detective é uma atualização da estética noir.  
Desta, tem como núcleo semântico o mal-estar causado pelo vazio moral. A figurativização  
desse núcleo semântico, nos filmes policiais das décadas de 1940 e 1950, era feita,  
principalmente, pelas sombras densas nos planos, muitas vezes, ocupando partes bem grandes  
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da composição. A metaforização da sombra como o mal iminente e próximo era uma solução  
plástica bastante funcional para aquela estética noir. No caso de True Detective, a transposição  
da narrativa para um espaço semirrural, aberto, e exacerbadamente ensolarado demandou outras  
formas de figurativizar o mal-estar moral. Ao invés das sombras, o excesso de sol. Mas a forma  
como isso foi registrado foi além de simplesmente denotar o espaço.  
A escolha pelas cores dessaturadas também carrega uma causticidade do ambiente, um  
desbotamento das coisas e das pessoas. Ao recusar registros de cor com mais vivacidade, o  
designer de produção e o diretor de fotografia imprimem, operando sutilmente, o calor e até  
mesmo a apatia da região. Também escolhem conscientemente padrões cromáticos que  
harmonizam com essa dessaturação das cores. Todos os marrons e ocres e amarelos pardos  
reforçam esse ambiente que é, a um só tempo, vivo, mas decrépito; um lúgubre luminoso. As  
paredes carcomidas, os vidros embaçados, as madeiras já apodrecidas não são elementos  
isolados, mas partes articuladas de um discurso visual que não apenas cumpre seu papel de  
construir o espaço narrativo; eles forçam sobre o espectador uma sensação de desesperança e  
abandono, evocando o cheiro ruim dos celeiros mofados, do sangue seco e do lixo espalhado  
na casa de Childress, o serial killer.  
Mesmo a comparação com os espaços “domesticados” do apartamento de Rustin e da  
casa da família de Martin recuperam essas escolhas e seus efeitos. Embora habitados e ocupados  
por personagens que não manifestam a sordidez e a decadência moral, os espaços domésticos  
são uma versão menos aguda da decrepitude encontrada nos espaços onde acontecem as  
investigações. Mas, ainda assim, a aridez cinza do apartamento de Rustin e os marrons  
decadentes da casa de Martin são manifestações suavizadas do mesmo discurso visual  
construído para a série.  
Além do significado de cada imagem, há uma mensagem difusa e perene, sutil, mas  
enfática; para remeter a um instrumental semiótico, há uma qualidade de sensação, uma  
primeiridade muito parecida com um quadro de Rothko ou mesmo um Francis Bacon. E esse  
efeito, afirmamos, é resultado da função poética que articula elementos expressivos do design  
de produção e da direção de fotografia.  
CONSIDERAÇÕES FINAIS  
A linguagem cinematográfica, composta por todos os elementos que constituem a obra,  
como enquadramento, iluminação, som, cenário, figurino, montagem etc. é responsável por  
materializar a narrativa. Cada elemento carrega consigo significados que podem ser explorados  
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das mais diversas maneiras. Quando utilizados de forma coesa, a obra final é capaz de envolver  
o espectador, despertando-lhe sentimentos e sensações.  
Grande parte desses sentimentos e sensações é transmitida por meio das imagens. Cada  
imagem é constituída por muitos elementos diferentes e optamos aqui por destacar as cores. O  
papel exercido por elas é, muitas vezes, silencioso, embora relevante para a criação de  
atmosferas, estimulando sensações e auxiliando a apreensão da história por parte do espectador.  
Nesse sentido, o recurso à função poética nas escolhas do design de produção e na  
direção de fotografia acaba por constituir uma qualidade difusa localizada entre o estímulo  
visual e a denotação das imagens; constrói-se uma atmosfera de sensações que, ainda que não  
se confunda com o significado de cada imagem, intensifica seus sentidos.  
A harmonia cromática marrom-cinza, em True Detective, é extremamente “sem vida”.  
Apesar dessas cores serem apresentadas nos mais diversos valores tonais, trata-se de cores  
pouco vibrantes que, quando combinadas, nos transmitem sensações sombrias. Afirmar que  
esse padrão cromático não foi aleatório pode parecer uma mera conjectura. No entanto, o que  
podemos afirmar é que as escolhas efetivamente efetuadas guardam relações paradigmáticas  
entre si e, com isso, manifestam o mecanismo de função poética que acentuam os elementos da  
história.  
Através da paleta cromática, demonstra-se aspectos psicológicos dos personagens e  
enfatiza-se ainda mais o clima da trama e a atmosfera da região, auxiliando a inserção do  
espectador na história. Ademais, a ausência de muitas cores vibrantes atua como uma  
ferramenta de foco para o espectador, visto que seu olhar não se distrai nas cenas e acaba  
focando nas ações dos personagens. Ainda que essas cores promovam estímulos imperceptíveis,  
elas influenciam a maneira como o espectador não somente compreende a narrativa, mas  
também como a sente.  
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